“O que importa é saber o que importa”

Fernanda Buriola
4 min readJul 6, 2021

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Texto originalmente publicado no Pão Com Manteiga no dia 18 de julho de 2020

Curadoria. Eu fui conhecer essa palavra cinco anos atrás. Conversando com uma amiga, ela usou o termo para definir meu mais novo trabalho que eu havia acabado de inventar para mim mesma. Se eu já havia ouvido essa palavra antes, ela não fazia parte do meu vocabulário ou da minha vida, mas lá estava eu, curando.

Às vezes duvido se sou uma verdadeira jornalista, mas posso dizer que sou uma curadora, lá do meu jeito. Mas afinal, o que é curadoria e porque ela importa?

Curadoria é sobre escolhas. Brevemente, é sobre escolher o que realmente vale a pena. O que importa ser compartilhado, o que importa ser exposto, o que importa ser ensinado. Maria Popova, uma curadora de livros, não gosta do termo, mas o defini como: “um guia para encontrar o que é interessante, significativo e relevante em meio ao vasto labirinto de informações superabundante, criando uma estrutura para o que importa no mundo e por quê.”

O processo chamado de curadoria existe porque existe muito. Em matéria de conhecimento, existe muita informação. No entanto, para chegar ao conhecimento, curadoria se torna um passo fundamental. Em um outro hyperlink, Maria explica esse processo:

“Muitas vezes, penso na arquitetura do conhecimento como uma espécie de pirâmide — na sua base, há todas as informações disponíveis para nós; a partir dela, podemos gerar alguma forma de insight, que depois consolidamos em conhecimento; na melhor das hipóteses, no topo da pirâmide, somos capazes de captar desse conhecimento algum tipo de sabedoria sobre o mundo, nosso lugar nele, o que importa nele e o por quê.”

Cortella, nosso querido pensador de fala tão agradável, escreveu sobre o assunto. Seu livro, “Era da Curadoria,” foi lançado em 2015. No ano seguinte, ele esteve no Café Filosófico para falar sobre a importância do “saber o que importa”. Uma das coisas que eu adoro sobre o Cortella é seu conhecimento etimológico. Ele sempre volta no real significado das palavras para explicar algo e eu acho isso o máximo. No Café, ele diz que a palavra importar significa levar para dentro, portar para dentro. Informação é o que chega, conhecimento é o que a gente leva para dentro e não se esquece.

Professores e educadores são talvez os primeiros curadores que encontramos nas nossas vidas. Eles decidem o que vamos aprender e o que devemos levar para dentro como conhecimento. Cortella argumenta a importância em conhecer a realidade de quem se quer ensinar, para justamente conseguir ensinar. “O curador é aquele que aprende junto.”

Saindo da escola, com sorte, chegamos no mundo do trabalho. Agora, quem decidi o que importa não são mais os professores, mas a TV e os jornais, os seja, os editores. Alain de Botton pode ter escrito um livro controverso sobre os meios de comunicação, mas acho pertinente quando seu grande projeto, The School of Life, diz que “a educação não é somente o que acontece nas escolas: as artes e a mídia têm papéis imensamente educativos.”

Se você nasceu lá pelos anos 90, assim como eu, quando você chegou na vida adulta já não existia mais alguns jornais e alguns canais de TV. A paisagem mudou e mudou depressa. Quando chegamos na vida adulta, a internet era tão adulta quanto nós. Agora a informação está na ponta dos dedos, mas o conhecimento, não necessariamente. É aí que entra o papel do curador. Como diz Cortella e sua sabedoria das palavras, curador é aquele que cuida para que o conhecimento leve para algum lugar. Você já se perguntou para onde a informação que você acessa está te levando?

Não é fácil navegar por esse mar de informação. “Nem todo mundo navega na internet, uma parte naufraga,” ele brinca. Será que não estamos sabendo navegar? “Para navegar você tem que ter clareza para onde você vai.” Desse modo, a curadoria nos ajuda a trilhar alguns caminhos.

Em plena pandemia, a Organização Mundial de Saúde tem outra preocupação: a infodemia. “Ter as informações corretas, no momento certo e de fontes confiáveis, é essencial,” eles dizem. Uma das recomendações, além de ser cauteloso com o compartilhamento, é passar menos tempo online e consumir informações apenas duas vezes por dia. Ou seja, em plena pandemia, a informação excessiva sem um guia nos deixa flutuante e pode ser um risco. Em plena pandemia, redescobrimos a importância da curadoria.

Esse foi o Pão Com Manteiga, um projeto que almeja triar a informação ao mesmo tempo em que traz diversos pontos de vista. Espero que vocês tenham gostado. O Pão Com Manteiga está sujeito a mudanças. Sugestões serão muito bem-vindas.

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